segunda-feira, 15 de abril de 2013

Tira a mão do corta-unhas


Eis o meu texto de ontem na revista do CM:

Num dos últimos fins-de-semana implorei à excelentíssima esposa que me tirasse os miúdos de cima durante um par de dias, para ver se eu conseguia despachar trabalhos em atraso e burocracias pendentes, que me andavam a dar cabo do juízo. Super-fofinha, ela acedeu ao meu pedido, e partiu com os quatro filhos para a província. Mas não só: além dos quatro filhos, levou também o meu corta-unhas.

Ora, se no que diz respeito aos miúdos eu estou sempre mortinho por ter uma folga, já no que diz respeito ao corta-unhas gosto bastante de o ter ao pé de mim. É uma presença que não incomoda e com a qual tenho uma relação feliz há muitos anos. Além de não chatear ninguém, é um competentíssimo corta-unhas, afiado e preciso, nada parecido com os tamancos que pululam pelos supermercados. Eu sei disso. E a excelentíssima esposa também sabe.

Vai daí, com o correr do tempo, o meu corta-unhas foi-se transformando no seu corta-unhas. Quando eu não estava a ver, a esposa efectuava raides ao esconderijo do corta-unhas, punha-o ao seu serviço durante uns minutos, e depois... Bom, e depois é assim: no início dos seus ataques furtivos, a esposa devolvia rapidamente o corta-unhas à procedência, e eu até achava a coisa romântica – éramos literalmente unha com carne, estão a ver? Só que a pouco e pouco, o regresso do corta-unhas a casa foi-se tornado mais desleixado: às vezes ficava fora do sítio, outras vezes eu tinha de perguntar por ele, até chegarmos a este ponto em que vai viajar para o interior de Portugal sem autorização do seu legítimo dono.

Confrontada com este gravíssimo rapto, a esposa respondeu: “Ias passar o fim-de-semana a trabalhar em casa, não pensei que fosses precisar do corta-unhas.” Como se as unhas só crescessem nos dias úteis. Mas o que isto, na verdade, revela é duas concepções da vida divergentes. Eu sou um individualista liberal: apesar de casado continuo a acreditar nas virtudes da propriedade privada. Já a Teresa é uma bolchevique doméstica: dentro de casa, o que é meu é teu, pois viver em família significa partilhar. E nisto andamos, há mais de 20 anos, comigo entrincheirado no WC, procurando resistir às terríveis investidas do comunismo familiar. Resultado: dei o corta-unhas perdido para o Kremlin e foi ao supermercado comprar um novo. Não é tão bom como o antigo. Mas – por enquanto – é só meu.


A ilustração é do José Carlos Fernandes.

9 comentários:

  1. Tenho um bebe com mês e meio. Tendo vocês 4 filhos e uma mãe médica, gostaria de um post com a vossa experiência sobre p-los a dormir, nesta idade tão precoce! Com esta idade já têm manhas? Habituam-se a dormir connosco tão pequeninos ou é próprio que sintam esta necessidade? Como habituá-los, em bebes, à cama deles?? Obrigada!!!
    Sandra

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    1. Ola chamo-me José Calado, tenho 4 filhos e acredite, que aprendem cedo, mas è maravilhoso,o ultimo criei-o sozinho desde os 10 dias de idade, hoje tem 5, sou o pai mais feliz do mundo. Não são manhas, è o aconchego, experimente a pô-lo na caminha dele quando estiver a dormir, e a colocar uma almofada leve ou uma mantinha, encostado a ele para ele sentir que não esta sozinho, habitue-se a cantar ou a falar com ele quando ele,mal sinta que ele està a acordar, tente com massagens leve no rabinho, e depois ponha novamente, um peso muito leve sobre o sitio onde tinha a mao,mas manter sempre a rotina da alimentação. um bem haja.:)

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  2. É preciso ter muita lata! Fala o pai que se estreou recentemente a cortar as unhas aos filhos. Durante oito anos nem uma vez e ainda se queixa da mãe da casa dar uso ao mais afiado cortador das redondezas.

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    1. Eu li o comentário sem ver de quem era e pensei: como é que este leitor/a sabe que só há pouco tempo é que o pai João se iniciou a cortar as unhas aos filhos? Eu perdi algum post?? Depois vi que era a mãe Teresa a comentar e percebi que sabia em 1ª mão! :-)

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  3. Hmmm, acho que não se queixou do uso que a mãe dá, mas sim do rapto, acto passível de processo criminal, descarado !

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  4. Ó deuses!, não sou a únicaaaa ... individualista liberal. Detesto que mexam nas MINHAS coisas. Peçam-mas e levem-nas emprestadas, mas!, mas!, caso as subtraiam sem conhecimento aqui da dona sujeitam-se a um dia, no mínimo, de mau feitio. :)

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  5. Hmm, sou só eu que acho estranho partilharem-se corta-unhas?? Eu acho que é o tipo de objecto "pessoal e intransmissível". Lá em casa cada um tem o seu.

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  6. Não há respeito! Levar assim o corta-unhas. Não se faz...

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  7. Ok, sofro do mesmo problema!
    tenho um EXCELENTE corta-unhas que, ressalvo foi adquirido previamente ao matrimónio.
    volta e meia dou por ele nas mãos alheias da esposa a servir para aparar "unha alheia".
    este comportamento abusivo ainda não chegou ao meu canivete suiço...mas temo por esse dia.

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