quinta-feira, 28 de fevereiro de 2013

Chegou!


Tenho finalmente nas mãos, acabadinho de chegar da gráfica, o meu terceiro livro infantil, O Pai mais Horrível do Mundo. Está lindo, lindo, lindo! Eu dediquei um livro a cada um dos meus filhos, e tenho orgulho em cada um deles, até por serem muito diferentes uns dos outros, mas este livro é ligeiramente mais especial. Por uma única razão: não é bem uma história saída da minha cabeça e dedicada a um dos meus filhos - este livro é o Gui. São as suas críticas à minha pessoa, é a sua malandrice e é também toda a ternura que se esconde por debaixo da sua pinta de puto reguila.

O João Fazenda fez um trabalho absolutamente maravilhoso na ilustração. Ele é um dos maiores ilustradores nacionais, com uma carreira já relevante fora de portas, e eu praticamente não o conhecia (em termos pessoais, claro) quando o convidei para este projecto. Por isso, eu tinha aquele medo de que uma pessoa assoberbada de trabalho, como é o seu caso, decidisse ligar o piloto automático e fosse muito bom (porque ele não sabe ser mau), mas não chegasse a ser extraordinário, como eu sabia que ele podia ser. Felizmente, ele foi mesmo extraordinário, como era necessário, já que o livro tem no total 500 caracteres de texto e vive em absoluto da dinâmica entre imagem e ilustração.

Com toda a sinceridade, não podia estar mais contente com o resultado final (e olhem que só muito raramente digo uma coisa destas), e talvez por isso nenhum dos meus outros filhos teve a reacção do Gui quando o livro chegou. Ele ficou doido de orgulho. Quer oferecer um a todas as pessoas que nos visitam e esvaziou uma das suas caixas de brinquedos só para guardar o seu exemplar. Ao longo do dia, vai-me pedindo para lhe ler as frases de cada plano, e depois mostra às pessoas que o sabe ler sozinho (embora não saiba).

Acha que o Gui se sente co-autor de O Pai Mais Horrível do Mundo. E faz bem em sentir-se. Porque é mesmo.


(O livro chega às livrarias a 8 de Março e será apresentado no dia 16, sábado, pelas 18 horas, na Fnac do Chiado. Mais detalhes sobre isso em breve - mas marquem na agenda, que eu gostava muito de vos ver por lá.)

Faz mal bater às crianças? Parte IV

Bom, pelos vistos não há muitos juristas a frequentar este blogue, ou estão entretidos com outras coisas mais importantes, como a reforma da Justiça em Portugal (e se assim for, concentrem-se nisso). A este meu desafio só respondeu o Rui Fachada (espreitem os comentários), de uma forma moderada e que me parece bastante razoável. Continuo à espera dos argumentos jurídicos de quem defende que em Portugal enfiar uma palmada correctiva no rabo de um puto é ilegal.

Em 2007 houve alterações ao artigo 152 do Código Penal, respeitante à violência doméstica (onde os filhos estão incluídos), que passou a ser definida como o acto de infligir "de modo reiterado ou não", "maus tratos físicos ou psíquicos, incluindo castigos corporais, privações da liberdade e ofensas sexuais". É verdade que uma leitura fundamentalista deste artigo pode considerar que uma nalgada é inflingir de modo não reiterado um mau trato físico a um descendente em 1.º grau, mas aí eu diria que estamos no domínio do delírio jurídico, tendo em conta aquilo que é comummente entendido como "violência doméstica".

É também verdade que a Organização Mundial contra a Tortura (chiça...) apresentou queixa contra Portugal no âmbito do Conselho Europeu em 2003 e em 2006, defendendo que a legislação portuguesa não estava conforme às regras da Carta Social Europeia Revista, que proibia quaisquer castigos corporais a crianças. Pelo que pude pesquisar aqui, foi inclusivamente entregue um estudo de acordo com o qual cerca de 80% dos pais e mães portugueses entendia ser legítimo dar bofetadas ou açoites nas crianças como forma de as educar. Para a Organização Mundial contra a Tortura (chiça...), parece que tais conclusões são sintomas da barbárie instalada.

Na queixa de 2003, o sentimento não foi partilhado pelas instâncias europeias, mas a queixa de 2006 foi considerada procedente, na medida em que foi acompanhada de um acórdão meio amalucado do Supremo Tribunal de Justiça que absolveu uma funcionária que usou violência sobre crianças com deficiência mental. O Supremo utilizou aqueles argumentos à macho lusitano da década de 50, do género dar lambadas só faz é bem e quem não as dá é que é mau pai. Tendo em que conta que se estava a falar de crianças deficientes e de uma funcionária de uma instituição, o argumento não tem pés nem cabeça.

Mas a jurisprudência portuguesa, felizmente, é mais equilibrada. Numa breve pesquisa por acórdãos encontrei juristas que defendem que "a finalidade educativa pode justificar uma ou outra leve ofensa corporal simples" (Taipa de Carvalho), que "de acordo com o ponto de vista maioritário a ofensa da integridade física será justificada quando se mostre adequada a atingir um determinado fim educativo e seja aplicada pelo encarregado de educação com essa intenção" (Paula Ribeiro de Faria) e até que "os pais detêm o poder-dever de corrigir moderadamente os filhos" (acórdão de 10 de Outubro de 1995).

Esta é a tradição portuguesa, que me parece muito salutar, e que fazendo as contas às reacções dos leitores deste blogue ainda está em clara maioria.

Sim, na Suécia os castigos corporais são proibidos desde 1979, e no Brasil anda em efusiva discussão a chamada "Lei da Palmada" (os brasileiros são sempre óptimos a dar nomes às coisas). O debate é obviamente fascinante, mas há um argumento liberal ao qual eu sou muito sensível, para mais no Portugal de 2013: o Estado e as leis não têm de estar com o nariz enfiado nas famílias e na educação dos filhos, sempre de dedinho em riste a querer legislar sobre o tamanho do pepino e a força de uma palmada no rabo.

Mais: num país onde a violência doméstica é uma tragédia tantas vezes silenciada, a confusão entre uma palmada no rabo de uma criança e a agressão física a uma mulher só vem confundir linhas que deveriam ser totalmente claras e estar absolutamente demarcadas. Aí, sim, é brincar com coisas sérias. 

E quem confunde as duas coisas devia levar um bom tau-tau.   



quarta-feira, 27 de fevereiro de 2013

Batam-me com o Código Penal, sff

Já várias pessoas sugeriram, nos comentários aos três posts sobre bater nos filhos, aqui, aqui e aqui, que bater nas crianças é ilegal em Portugal (obviamente, não me refiro a maus tratos físicos mas à clássica palmada no rabo). Alguém se importa de desenvolver esse raciocínio, por favor? Tenho interesse na fundamentação jurídica da coisa.

Em defesa da honra (e das calças ao contrário)

Em relação a este post, venho defender a minha honra, embora já um bocado atrasado, o que é sempre mau para a defesa da honra. É que estive ocupado a espancar crianças e não tive tempo (mais uma piada infeliz). Bom, a verdade é esta: um gajo ganha a injustíssima fama de ser um bocado distraído, e a partir daí leva com o carimbo de pai-maluco no meio da testa, carimbo esse que irá ostentar até ao fim dos seus dias, mesmo que de repente se transforme num relógio-suíço de competência na gestão da logística familiar.

Não fui eu que vesti aquelas calças ao Gui, ok? O que eu fiz foi - num acto de grande desejo emancipatório, tomado pela vontade de promover a independência da criança, imbuído de um espírito ambicioso com o intuito de o ajudar a enfrentar a vida com melhores armas - dizer simplesmente ao Gui: "Vai-te vestir, pá!" E ele lá foi vestir as suas próprias calças.

Que o Gui, com quase cinco anos, pense que faz chichi pelo rabo, é lá com ele. Só é comigo na medida em que deveria ter produzido filhos mais espertos. Provavelmente, estaria desconcentrado na altura em que o estava a produzir, que é uma coisa que costuma acontecer nessas situações.

Ou melhor, sejamos justos: o Gui de parvo não tem nada. O que ele tem é uma técnica incrível de fazer chichi: de cada vez que chega a altura de se aliviar, as calças vão todas para baixo, quer faça chuva quer faça sol, quer esteja no campo ou na cidade, quer seja em frente à sanita da sua casa de banho ou da casa de banho de um restaurante. Para ele é-lhe absolutamente indiferente a geografia: calças para baixo e lá vai disto. Nesse sentido, para quem pratica tal actividade radical, a localização da braguilha é completamente indiferente.

O importante é fixarem isto e repetirem 30 vezes: "não foi o pai dele, não foi o pai dele, não foi o pai dele". Devia ter olhado para ele depois de se ter vestido? Devia, com certeza. Mas provavelmente havia um congestionamento de filhos no corredor e eu não consegui chegar ao carro da frente. Acontece, senhores. Aliás, a minha excelentíssima esposa fica tão feliz com estas oportunidade para gozar comigo, que vale sempre a pena. Reparem como alegrámos o dia a tanta gente.

Mas NÃO FUI EU, ok? (Repitam só mais uma vez.)


Faz mal bater às crianças? Parte III

A propósito da minha observação sobre os suecos, incluída no ponto 3 deste meu post, comentou a Joana:

"Não concordo nada com o que dizes sobre os suecos (...). Lá porque os suecos são menos efusivos do que os portugueses, não quer dizer que tenham laços familiares mais fracos. Só o demonstram de forma diferente de nós. 
Só para dar um exemplo de como a família (e os seus laços) tem importância na sociedade: quando se tem filhos pequenos, é perfeitamente normal sair todos os dias do escritório cedo (o mais tardar às quatro e muitas vezes mais cedo) para os ir buscar - ninguém comenta ou olha de lado, como seria aí o caso. Os pais com filhos conseguem organizar o dia-a-dia de modo a que são eles que estão com os filhos nas tarefas diárias, e não precisam de depender de avós ou empregadas para estarem com os miúdos até se chegar a casa - como acontece tantas vezes em Portugal, em que muitas vezes se chega tão tarde que já são horas de os miúdos irem para a cama.

Aliás o Estado social e as instituições suecas nem poderiam ter evoluído para o que são hoje, se a família e os seus laços não fossem tão fortes como são. Moro na Suécia há oito anos, tenho montes de amigos da nossa idade e nos quarentas com filhos, desde bébés a adolescentes, e sei bem do que falo. E não sou casada com nenhum sueco, por isso acho que consigo manter a independência nas minhas observações e comparações :-)."

Um outro leitor saiu em defesa da minha tese, aconselhando uma visita ao Portal de Opinião Pública da Fundação Francisco Manuel dos Santos, e em particular aos dados relativos ao dever de amar e respeitar os pais, onde se compara Portugal e a Suécia (nós goleamos).

Não vivendo eu na Suécia, admito que possa ter a visão distorcida por demasiado cinema escandinavo, de Ingmar Bergman a Lars von Trier, cujos níveis de angústia existencial, amorosa e familiar são deveras assustadores. Além disso, tenho a profunda convicção de que o mais espantoso gesto que Portugal, enquanto povo, teve ao longo dos últimos 100 anos, foi a forma como conseguiu acolher perto de um milhão de pessoas oriundas das antigas colónias a partir de 1974, num movimento migratório de uma dimensão nunca antes vista na Europa no último século quando comparada com a percentagem da população residente em Portugal na altura.

Isso é, de facto, único e não sei que outro país o conseguiria ter feito sem o colapso da sua estrutura social. Não há outra explicação para essa extraordinária generosidade que não a profundidade dos laços sociais e familiares em Portugal e a capacidade que nós temos, enquanto povo, em ajudar as pessoas mais próximas que estão em dificuldades (claro que esta face branca tem uma face negra, que é a cunha, o favorzinho e a pequena corrupção, mas isso são contas para um outro rosário).

Dito isto, não quero cair no extremo oposto e fazer de Portugal o cume da civilização no que à educação das crianças diz respeito, portanto acho que a Joana tem alguma razão na crítica que me faz. A minha ideia original não era dizer "nós somos melhores do que eles", mas relendo o texto é, de facto, o que parece. A ideia original era apenas frisar que não estamos a discutir a segurança social, o funcionamento do Parlamento ou a aplicação da Justiça, e que portanto a utilização da matriz "país mais civilizado" para discutir estes temas é altamente perniciosa.


(Atenção, almas sensíveis: esta ilustração é só uma piada foleira. Até porque nunca arriscaria estragar a capa de um livro nos dentes dos meus filhos.)

terça-feira, 26 de fevereiro de 2013

Faz mal bater às crianças? Parte II

Em relação aos inúmeros comentários a este post, queria saudar a forma civilizada como a discussão está a decorrer, sem demasiadas palmadas verbais (coisa que é raro acontecer na blogosfera). E, de caminho, aproveito para acrescentar algumas notas:

1. No próximo Santo António vou arranjar um manjerico e espetar nele a seguinte quadra: "Quem consegue educar/ sem levantar a mão/ terá para todo o sempre/ a minha admiração." Eu acho que deixei isso claro no meu post: quem acredita nisso, pratica isso, e consegue que isso funcione, faça workshops, por favor. Este blogue prova diariamente - gosto eu de acreditar - que não sou nenhuma espécie de modelo como pai e que deve haver muitas dezenas de milhares de gajos e gajas com muito mais talento para esta actividade do que eu. Se enfio umas palmadas nos rabos dos meus filhos é porque nunca consegui educá-los convenientemente sem lhes chegar a roupa ao pêlo. Pode ser falha minha, com certeza. Mas acho a tal domesticação civilizacional inevitável, e nunca encontrei outra forma eficaz de exercer a actividade. Num dos comentários, a Céu Franco deu o óptimo exemplo de uma criança muito pequena a meter os dedos nas tomadas eléctricas. Alguém sabe convencê-la a não enfiar lá os dedos utilizando apenas pacientíssimos "isso não se faz?". Ensinem-me, sff, que em breve vai dar-me jeito para usar com a Rita.

2. Como explica a Sofia Carvalho no seu comentário, os filhos são mesmo diferentes uns dos outros, e nestas coisas da pedopsiquiatria caseira nós acharmos que existe uma fórmula perfeita e universal é uma grandessíssima treta.  Os filhos, as famílias e as circunstâncias são demasiado complexas e variáveis para alguém ter o atrevimento de achar que existe a solução, única e definitiva. O meu filho Tomás fica muito mais afectado com uma descompostura do que com um açoite, e portanto muito raramente lhe toco com um dedo. Já o meu filho Gui está-se nas tintas para a dialéctica e para todas as teses, antíteses e sínteses que não metam falangetas. E portanto...

3. Ainda nos comentários, a Helena defendeu efusivamente a tese da não-agressão, que eu não me sinto minimamente preparado para rebater cientificamente, embora seja fácil encontrar estudos que dizem o contrário. Mas, como dizia alguém, estudos deste género há para todos os gostos. O que eu queria aqui rebater é uma tese que está implícita nas suas intervenções, que é a de haver países mais avançados em termos de civilização e educação. Eu tenho muito inveja das instituições suecas, mas no que diz respeito à família diria que a cultura mediterrânica não tem muito a aprender ali. Os nossos laços familiares têm uma força com que os suecos nem sequer sonham. Eu não me importava nada de importar o seu Estado social mas deixem-me por favor ficar com as minhas famílias ibéricas trauliteiras. Em relação aos Estados Unidos, então, nem vale a pena falar - basta abrir a televisão.

4. A IndieGirl diz: "Bater nunca é legítimo! Dar um estalo a uma namorada é o fim do mundo, mas bater a um ser indefeso, que está a crescer, é educativo?!?!?" Por favor... Como disse, não só percebo como invejo quem educa sem levantar a mão. Mas comparar uma palmada numa criança com uma estalada numa mulher é um absurdo total. Uma criança de três ou quatro anos está num processo muito inicial de desenvolvimento e o castigo físico só é aceitável por se entender que é a forma mais eficaz de a impedir de repetir um gesto impróprio. Gesto esse que, em última análise, a prejudicaria a ela, como no caso acima citado de enfiar os dedos na tomada. De que forma é isso transponível para um quadro de violência doméstica? Não faz qualquer sentido.


Já tinha visto muita coisa. Mas isto ainda não

Isto é o que acontece quando deixamos o marido a tomar conta do vestuário das crianças enquanto damos de mamar. Camisolas do avesso, miúdos sem casaco em dias de frio de rachar, sapatos trocados de pé, sapatos trocados de filho, já houve de tudo. Esta, contudo, é uma estreia.



Faz mal bater às crianças?

A propósito deste post e do tau-tau, escreveu um leitor:

Definitivamente, ainda serão precisos muitos anos (ou mesmo séculos) para que os pais (não todos, felizmente) e a opinião pública em geral (não toda, felizmente) perceba que o castigo físico que muitos pais ainda utilizam para educar os filhos não é legítimo, tal como outra qualquer expressão de agressão de um ser humano para outro (mesmo que seja para afastar a mosca como muitos dizem em sua defesa). Nesse dia, bater num filho (ainda que com o pretexto de estar a educá-lo) será tão condenável como hoje já é a agressão do marido à mulher (agressão esta que outrora também foi prática corrente, aceite e justificável).


Ora vamos cá ver. Em primeiro lugar, seria de bom tom não fazer comparações entre a palmada que um pai dá no rabo de uma criança e a agressão de um marido a uma mulher. É uma comparação de tal modo desproporcionada que nunca dá bom resultado. Mas eu percebo que o leitor tenha chegado a ela, porque todo o raciocínio parte da premissa de que há uma igualdade entre pais e filhos que proíbe o castigo físico ("agressão de um ser humano para outro"), já que ambos são seres humanos.

Recuso em absoluto essa tese. É verdade que ambos são seres humanos, mas não há, de todo, uma igualdade entre pais e filhos, e tratar os filhos como nossos iguais é mau para ambas as partes. A hierarquia pai-filho deve estar bem estabelecida, não tanto por nossa causa, mas por causa deles - é ela que lhes dá segurança. E nesses aspecto, uma palmada no rabo ou uma estalada na mão desempenha o seu papel numa fase em que as crianças são demasiado novas para compreenderem argumentos racionais - ou, mesmo quando os compreendem, insistem ainda assim em passar dos limites.

Pode ser que haja pais fabulosos que consigam, sem recurso à palmada ou ao grito (que eu também pratico muito, às vezes mais do que gostaria), educar exemplarmente os seus filhos. Se assim for, ofereçam-me um workshop, se faz favor. Eu nunca consegui. Até por volta dos sete anos, aquilo que o leitor chama tragicamente de "castigos físicos" a mim sempre me pareceu uma ferramenta educativa essencial. A partir dos sete, a criança ganha uma autonomia, um nível de responsabilidade e de compreensão das coisas que tornam a palmada desnecessária, a não ser em caso de catástrofe comportamental. Há, evidentemente, um altura para parar de bater, como demonstram alguns estudos). Eu não me lembro da última vez que bati à Carolina.

Mas o Gui de vez em quando apanha, sim. E apanha porque, ao contrário de tanto discurso cor-de-rosa, educar também é domesticar. Além de inteligência e racionalidade, nós temos um lado animal fortíssimo, e a civilização, que é aquilo que nos afasta dos bichos, é uma construção milenar altamente castradora. Comer com talheres, lavar os dentes, pentear o cabelo antes de ir para a rua, cumprimentar o vizinho, nada disto são actos naturais. É mais giro comer com as mãos, andar desgrenhado, não falar a ninguém.  Educar é impor, é domesticar, é castrar, e para um libertário é até uma coisa muito feia de se fazer - porque nos uniformiza, torna-nos a todos demasiado parecidos. Mas eu não sou libertário. Sou mais para o conservador, e acredito nas vantagens da disciplina e na imposição de regras que nos ajudam a orientar ao longo da vida.

Toda a gente sabe que os homens são animais racionais, mas depois concentramo-nos demasiado no adjectivo e esquecemos o substantivo. Animais, sim. Somos bichos num eterno processo de domesticação (e muitas vezes a lutar contra ele). E a experiência diz-me que as palmadas que doem não são as que batem com muita força. São as injustas. E essas, sim, eu esforço-me ao máximo para as evitar. 

Novas aventuras de um pai-zombie

Uma virose que se transformou em otite, febres, pesadelos nocturnos, espertinas de uma hora às quatro da manhã, putos aos gritos, e, para culminar, tipo a cerejinha em cima do bolo, chichi na cama - coisa que já não acontecia desde que Miguel Relvas era um tipo popular. Em resumo: mais uma grande noite. Os pais deviam juntar-se para criar a Associação que Remova o Inverno da Vida das Crianças até aos Seis Anos. Elas precisam de narizes desentupidos. E eu preciso de dormir.

segunda-feira, 25 de fevereiro de 2013

One Baby Band

Isto é tãããooo bom:


Tapetes em forma de puzzle

A propósito deste post, uma leitora com olho de lince perguntou - imagine-se - não onde comprar a máscara do Obama, mas sim onde comprar o tapete de borracha em forma de puzzle que está no chão. A resposta é: Decathlon. A má notícia é: é caro como tudo. Eu devo ter na minha sala para aí dois metros quadrados, que me ficaram por perto de 50 euros (duas embalagens), acho eu, o que é um absurdo para um bocado de borracha. Em geral, isto é usado para colocar aparelhos de ginástica por cima. Nós usamo-los cá em casa para os nossos filhos poderem praticar taekwondo na sala.

domingo, 24 de fevereiro de 2013

Dá-lhe, Michelle!

Os Obama, como todos sabem, são os maiores. Michelle esteve no programa de Jimmy Fallon, a promover a sua campanha de combate à obesidade, e no final aconteceu isto:


Estão a ver Maria Cavaco Silva a fazer o mesmo?

10 razões para ter filhos

O texto que saiu na revista do CM de hoje começou neste blogue, nos comentários a um post, quando uma leitora me perguntou por que tive eu tantos filhos, se me queixo (e me canso) tanto de ser pai. É uma boa pergunta. Eis algumas das razões:


Há dias, uma leitora, farta de me ouvir resmungar, fez-me esta pergunta: se eu me queixo tanto dos miúdos, se eles me dão cabo da cabeça e me tiram tanto tempo, por que raio decidi eu tê-los, e ainda por cima logo quatro? E de repente, percebi que nunca respondi cabalmente a esta importantíssima questão. Porquê?, de facto. Vai daí, decidi alinhavar 10 razões para ter filhos, como penitência por estar sempre a dar razões para não os ter.

1. A razão ontológica. Ser ou não ser não é para mim uma questão. Sófocles escreveu que o mais feliz dos seres era aquele que nunca tinha nascido. Faulkner escreveu que entre a dor e o nada, escolhia a dor. Eu voto em Faulkner. Mil vezes ser do que não ser. E nascer é fazer ser.

2. A razão estóica. Há um lado olímpico em ter muitos filhos. Eles testam os nossos limites e são um desafio permanente às nossas capacidades físicas e mentais. Não sou capaz de saltar à vara nem de correr a maratona. Mas criar quatro putos dá uma abada a tudo isso.

3. A razão ulrichiana. Numa civilização acolchoada, sem guerras nem catástrofes, o pessoal tende a amolecer e a confundir chatices com tragédias. Ter muitos filhos sintoniza-nos com a máxima do banqueiro Fernando Ulrich: “Ai aguenta, aguenta.” Que remédio.

4. A razão romântica. Quando se ama alguém, os desejos do outro contam. Se a felicidade da minha mulher passa por ter uma família grande e se a minha felicidade passa pela felicidade da minha mulher, então a minha felicidade passa por ter uma família grande. Chama-se a isto “propriedade transitiva”. É muito importante na matemática. E no amor.

5. A razão revolucionária. Citando o sábio Tiago Cavaco na luminosa canção “Faz Filhos”: nos nossos dias “constituir família é a suprema rebeldia”. Ambos partilhamos a fé neste verso: “Conquistas fabulosas através das famílias numerosas.”

O resto das razões podem ser encontradas aqui. A ilustração, como sempre, é do José Carlos Fernandes.



Um cartoon para domingo #2

Desde o final de Calvin & Hobbes, nenhuma tira é tão boa quanto Mutts, de Patrick McDonnell, na sua mistura de pequeno humor e grande sabedoria.


Diálogos em família #10

- Avô, tu podes dar tau-tau ao teu filho?
- Porque é que tu queres que eu dê tau-tau ao meu filho, Gui?
- Porque só os papás é que podem dar tau-tau aos filhos. O meu papá está sempre a dar-me tau-tau. Não podias dar tu tau-tau a ele?

sábado, 23 de fevereiro de 2013

500 000

Hoje, acertando em cheio na festa dos nove anos da Carolina, aconteceram neste blogue duas coisas importantes, que vale a pena comemorar. Chegámos aos 1000 comentários publicados e ultrapassámos a barreira das 500 000 visualizações. Para um blogue que só arrancou há dois meses e meio, é obra. Para todos os leitores que encontram na partilha da nossa vida suficiente motivo de interesse para nos vir visitar regularmente, um grande obrigado.


Sonhos de índia

Como a festa dos nove anos da Carolina é hoje, a nossa casa está tão cheia como o sambódromo em noite de Carnaval. Avós, madrinhas, tias, montes de gente a vir da província para celebrar os anos da rapariga, que isto ainda é uma família à moda antiga. Embora a casa seja grande, as camas não chegavam para todos, e a Carolina teve de dormir no chão do quarto de brincar. Disse "no chão"? Qual chão. Na tenda. A Carolina dormiu numa incrível tenda de índio.


Ela adormeceu contentíssima. E a criança que há em mim ficou ligeiramente invejosa.

Coisas para as quais só mesmo a minha excelentíssima esposa é que tem pachorra

Hoje acordei e a mesa da sala estava assim:


Esta fabulosa linha de montagem de bolinhos e prendinhas tem uma razão: a festa dos nove anos da Carolina é esta tarde, em Sintra. E enquanto eu dormia (perdão, enquanto eu tomava conta da Ritinha no nosso quarto), a Teresa levou com certeza a noite toda nisto. O amor de mãe é uma coisa bué linda. E assim um bocadinho avariada, como todos os grandes amores.

Eu Seguro

O grande Samuel Úria tem um novo disco, chamado O Grande Medo do Pequeno Mundo, e dele consta a melhor canção monogâmica da história da música portuguesa. É um dueto com Márcia, que já tem teledisco e tudo, para se poderem deliciar:


E para os mais líricos e meditativos, aqui fica a extraordinária letra:

Eu Seguro

Quando o tempo for remendo,
Cada passo um poço fundo
E esta cama em que dormimos
For muralha em que acordamos,
Eu seguro
E o meu braço estende a mão que embala o muro.

Quando o espanto for de medo,
O esperado for do mundo
E não for domado o espinho 
Da carne que partilhamos,
Eu seguro.
O sustento é forte quando o intento é puro.

Quando o tempo eu for remindo,
Cada poço eu for tapando
E esta pedra em que dormimos
Já for rocha em que assentamos,
Eu seguro.
Deixo às pedras esse coração tão duro.

Quando o medo for saindo
E do mundo eu for sarando
Dessa herança eu faço o manto 
Em que ambos cicatrizamos 
E seguro.
Não receio o velho agravo que suturo. 

Abraços rotos, lassos,
Por onde escapam nossos votos.
Abraso os ramos secos, 
Afago, a fogo, os embaraços
E seguro,
Alastro essa chama a cada canto escuro.

Quando o tempo for recobro,
Cada passo abraço forte
E o voto que concordámos
É o amor em que acordamos,
Eu seguro:
Finco os dedos e este fruto está maduro.

Quando o espanto for em dobro,
o esperado mais que a morte,
Quando o espinho já sarámos
No corpo que partilhamos,
Eu seguro.
O que então nascer não será prematuro.

Uníssonos no sono,
O mesmo turno e o mesmo dono,
Um leito e nenhum trono.
Mesmo que brote o desabono
Eu seguro,
Que o presente é uma semente do futuro.

sexta-feira, 22 de fevereiro de 2013

Em defesa da honra (e do pijama)

A propósito disto e do comentário sobre eu ter ficado de pijama em frente ao computador, vinha, em defesa da honra, declarar duas coisas:

1. Eu não quero estar para aqui a dizer que a Carolina gosta mais da mãe do que do pai, embora até goste, como eles gostam todos, o que só prova que têm bom gosto. A questão é que pai e mãe servem, na cabeça deles, para coisas diferentes. E, na verdade, não é só na cabeça deles: servem mesmo para coisas diferentes. Por isso é que somos uma família. A certa altura, colocou-se a hipótese de o Tomás ir também ao almoço, mas entretanto ele ficou em casa com febre. E a partir desse momento, não se duvide que a Carolina iria infinitamente preferir mais um almoço a dois, só com a mamã, do que a três. Porquê? Porque um almoço com a mamã é um almoço de mulheres, coisa que ela quase nunca tem, e que obviamente adora. Se eu lá estivesse era um almoço com os pais - o que não é, de todo, a mesma coisa. Aliás, a post da Teresa só demonstra como eu sou espertíssimo e tenho razão.

2. Quando se diz "de pijama à frente do computador" mais parece que um tipo fica em casa a ver gajas nuas na internet ou os mais recentes telediscos da Sónia Araújo em loop. Ora, estar "de pijama à frente do computador", para aí em 97% do meu tempo, significa... espera, como é que é mesmo a palavra?... aquela coisa que muitas vezes é chata de fazer mas que tem mesmo de ser feita... ah, já sei: trabalhar! É isso. Chama-se "trabalhar". Foi o que o palerma aqui ficou a fazer em frente ao computador, de pijama, em vez de estar a enfiar o dente nas pizzas do Lucca - a trabalhar. É verdade que também estive a ver os mais recentes telediscos da Sónia Araújo. Mas isso é porque tenho um trabalho giro.


A maioridade da Carolina

A nossa Carolina fez ontem nove anos. Há um mês que não falava noutra coisa e ansiava por este dia como se fosse fazer 18. No fundo, para ela os nove são os 18 da infância. Assim uma espécie de infância adulta:

- Ó mamã, ninguém liga ao que diz uma criança de oito anos. Mas a uma de nove já ligam.

Para manter a tradição fomos almoçar ao Lucca, mas desta vez fomos só as duas. O João disse-me que achava que ela preferia assim (e eu achava que ele preferia ficar de pijama à frente do computador) e lá fui buscá-la à escola no intervalo do almoço. Foi um almoço apetitoso e um apetite de almoço: conversas de crescidas, confidências, trocas de números de telemóvel (foi a sua prenda, mais por necessidade dos pais), planos para o futuro... Será que ela vai ter nove muitos anos? Acho que vou ter saudades toda a vida.



quinta-feira, 21 de fevereiro de 2013

Canções para crianças? Está bem, está...

A Sónia Araújo lançou um projecto infantil intitulado "Sónia e as Profissões", que invadiu o Canal Panda. A primeira canção a sair para a rua chama-se "A professora", e apresenta a Sónia de rabo de cavalo, óculos de massa e saia pelo joelho.


A segunda canção chama-se "O bombeiro", e nela a Sónia interpreta uma espécie de bombeira, que embora não chegue a pegar na mangueira para combater o fogo, usa calças muito colantes, ombros de fora e um sorriso convidativo (tudo coisas típicas de bombeiro).


Estou capaz de apostar que os pais das criancinhas vão começar a interessar-se imenso pelo Canal Panda. Professora boazona de óculos de massa e bombeira ágil e cheia de curvas? E a seguir vem o quê? A mulher polícia com algemas e a padeira enfarinhada? Ó meus amigos. Isto não são canções para pôr crianças a cantar. Isto são canções para pôr os fétiches sexuais dos papás a tilintar. Se bem me recordo, até já vi uns filmes com personagens muito parecidas. E não eram para maiores de quatro anos.

quarta-feira, 20 de fevereiro de 2013

A Crise chega à Grécia

OK, a crise já chegou à Grécia há muito tempo. Mas a minha crise ainda não tinha chegado. Chegou agora, através das páginas de uma publicação local, que dedica quatro páginas ao meu primeiro livro (mais ou menos) infantil, A Crise Explicada às Crianças. Não faço patavina de ideia do que lá esteja escrito, mas o alfabeto grego é tão bonito que não resisti a vir para aqui vangloriar-me.


Decoração de interiores à Gui

Ia a sair de casa e voltei atrás para partilhar com vocês a mais recente intervenção do Gui na decoração da nossa sala, da qual ainda não me tinha apercebido. Fica mesmo a matar, não fica?


Obama cumprimenta Gui

Impressionadíssimo com o conteúdo deste post, Barack Obama apanhou o Air Force One e veio cá a casa cumprimentar pessoalmente o Gui, agradecendo o seu esforço tão prematuro para se vir a tornar o futuro presidente dos Estados Unidos da América.

O Gui ficou extremamente feliz por conhecer Obama e o fotógrafo oficial da Casa Branco registou o momento para a posteridade. Aqui está ele:


terça-feira, 19 de fevereiro de 2013

Descontos por bom comportamento

Através do óptimo blogue da minha amiga João, cheguei a um blogue do New York Times dedicado aos assuntos da parentalidade, que por sua vez me remeteu para um blogue chamado Consumerist. Todo este frenesim internético deve-se a esta óptima história: um restaurante americano ofereceu no final da refeição um desconto a uma família pelo simples facto de as crianças se terem portado bem durante a refeição.


A ideia pode ser discutível, mas parece-me um gesto bem simpático, que ajuda a confortar aqueles pais que tantas vezes se sentem acossados por olhares de reprovação em restaurantes mais finórios. Só espero que não lhes dê para agravar a conta em 10% se por acaso tiverem de levar com alguma birra em cima durante uma refeição...

O boneco favorito da Rita

A propósito deste post acabei por descobrir que a girafa de borracha que a Rita tanto adora é um sucesso mundial.

A girafa Sophie foi carinhosamente oferecida à Rita, quando ela nasceu, pelo professor de inglês dos miúdos, regressado de umas férias em França. Na altura percebi que a girafa era fabricada artesanalmente no sul de França e a sua composição à base de borracha era 100% natural. Não fixei mais do que isso, mas a girafa passou a ser uma companheira da Ritinha desde que nasceu.


Qual não foi o meu espanto quando dei com a Sophie numa das cenas do filme Três Homens e um Bebé (um filme de 1987), enquanto me tentava manter acordada numa das minhas últimas madrugadas. Resolvi pesquisar e percebi que a pequena girafa já tem mais de 50 anos (nasceu em 1961!) e a sua produção artesanal é preservada desde o seu nascimento, o que faz dela um dos poucos brinquedos mordedores para bebés sem ftalatos, PVC, retardantes da chama ou chumbo... os grandes inimigos tóxicos dos pimpolhos em crescimento.


Velhinha, mas uma boa amiga da Ritinha!

segunda-feira, 18 de fevereiro de 2013

Gui a caminho da Casa Branca

Inspirada pela folia do Carnaval, a Carolina resolveu fazer dos manos seus modelos e desatou a pintá-los segundo a sua imaginação.

Perguntou ao Gui o que ele queria parecer:

- "Quero ser um senhor rico que joga no bingo", disse ele.

E esta foi a obra da Carolina:


Nada mal, achei eu (pontos extra pelo bigode enrolado, que para ela só os ricos se podem dar ao luxo de ter) - não fosse a tinta ter-se metido entre os dentes e as gengivas, o que me deu um trabalhão a remover.

Mas a obra-prima do dia só apareceu horas mais tarde, quando todos já estavam lavadinhos e bem cheirosos. Tomado pela mais desvairada criatividade, o Gui resolveu esconder-se na casa de banho. Algum tempo depois, fazia a sua entrada fulgurante.


A avaliar pela imagem podem adivinhar o rasto que deixou atrás de si. Da toalha da casa de banho aos interruptores da luz, passando pelas portas brancas, as provas do crime estavam por todo o lado.

O Gui só não apanhou mais do que um ralhete porque a sua justificação para a pintura facial-radical recebeu nota máxima por parte do júri:

- "Só queria parecer o Barack 'Obana'", disse ele.

Cá em casa o Barack Obama é o maior, e se é para chegar a presidente dos Estados Unidos, convém realmente começar por algum lado. Nós preferíamos que fosse pela parte de dentro da cabeça, mas o Gui preferiu começar pela parte de fora.

E no final não faltou sequer a pose presidenciável, feita de propósito para a câmara.


É um profissional, este Gui. Digam lá: está ou não está parecido?

Quem és tu?


Eis o meu texto de ontem na revista do CM:

Vocês já foram assaltados pela sensação de não conhecerem os próprios filhos? Eu sei que esta pergunta tem ressonâncias pouco simpáticas, porque geralmente o “eu não te conheço!” é o corolário de uma asneira do tamanho do Mosteiro dos Jerónimos. Pode ser um filho que chega a casa com os copos. Ou uma filha que é apanhada a fumar às escondidas. Mas, como imaginam, os meus ainda são muito novos para me proporcionarem esse género de surpresas. E por isso, não é de decepções que quero aqui falar, mas do seu contrário. É chegar a uma festa de anos e o pai do aniversariante dizer: “O seu filho portou-se maravilhosamente, comeu tudo sozinho.” Isto quando em nossa casa é preciso sermos nós a enfiar-lhe a sopa pela goela abaixo se queremos que o jantar acabe antes do nascer do sol. “Que bem-educado que ele é”, acrescenta o dono da casa. E nós pensamos para com os nossos botões: “Ai é?”

Em 1927, um senhor alemão chamador Werner Heisenberg formulou o hoje famoso princípio da incerteza, que de forma muito simplificada diz que para conhecer a posição exacta de um objecto é necessário que um instrumento de medição interaja com ele, e que essa interacção acaba por alterar a posição que queremos encontrar em primeiro lugar. O princípio de Heisenberg é sobretudo útil no estudo de partículas subatómicas, mas eu acho que essa incerteza também pode ser estendida a volumes bastante superiores, como eu ou o caro leitor, e à relação dos pais com os filhos. Chamemos-lhe (modestamente) o Princípio da Incerteza do Tavares: “Para conhecer um filho é necessário observá-lo, e quando ele está ao pé de nós é uma outra pessoa.”

O resto do texto pode ser lido aqui. A ilustração é do José Carlos Fernandes.

domingo, 17 de fevereiro de 2013

Retrato da minha manhã de domingo


Passei a manhã no meio disto, mas infelizmente não foi a brincar. A Teresa arregimentou-me para ir ajudar a pôr os Playmobil em ordem. As espingardas dos cowboys estavam nas mãos dos vikings, as armas dos cavaleiros estavam a ser utilizadas por pacíficos agricultores, uma espada poderosa estava perdida no meio do presépio e sobretudo o furacão Katrina (ou seja, o Gui) tinha passado por cima da prisão dos Faroeste e da respectiva diligência, deixando destroços um pouco por todo o quarto.

Para um espírito metódico e coleccionista como eu, ver aquele caos é uma dor de alma. Mas tentar pôr ordem em dezenas de bonecos sem as caixas originais é quase tão difícil como controlar o défice da república portuguesa. Acho que vou começar a tirar fotografias das caixas antes de as mandar para o lixo e guardar tudinho numa pasta do computador. Às tantas é impossível um gajo saber se determinado capacete pertence aos vikings, aos cruzados ou aos cavaleiros dos dragões. E daqui a 20 anos isto pode perfeitamente valer uma pipa de massa no eBay. Há que pensar no futuro e, de caminho, exigir um mínimo de rigor histórico às brincadeiras dos miúdos.

Passatempo para domingo

Há por aí fanáticos de filmes de acção? Então ponham a vossa cultura geral à prova com isto: que filme corresponde a cada uma das letras (os nomes são em inglês, claro)?


sábado, 16 de fevereiro de 2013

Goodnight sweetheart, well it's time to go...

A Rita dormia muito bem. Isso era antes de eu ter começado a trabalhar, e antes de o seu nariz ter ficado mais congestionado do que a Segunda Circular em hora de ponta, devido ao ataque das últimas maleitas respiratórias cá em casa. Resultado: voltei a precisar da companhia da televisão, como precisava nos primeiros meses da Rita para não adormecer enquanto a amamentava.

Numa das últimas madrugadas apanhei no Canal Hollywood o início do filme Três Homens e um Bebé e voltei a rir à grande (desta vez em surdina) com as peripécias dos três solteirões Tom Selleck, Steve Guttenberg e Ted Danson, a tentarem desesperadamente tomar conta de uma bebé.


Algumas cenas pareciam ter sido filmadas cá em casa com o resmungão do João, que não se cansa de se queixar das suas obrigações de pai, sobretudo para com a Rita, mas que não resiste aos seus sorrisos e fica deliciado com as suas gracinhas. Consigo imaginá-lo na pele do Tom Selleck, a colocar uma grande fralda para incontinentes à pequena Mary; na do Steve Guttenberg, a tentar chantageá-la com dez dólares para parar de chorar; ou na do Ted Danson, aos gritos porque depois de a ter deixado em cima da cama sem fralda ela resolveu deixar uma prenda malcheirosa nos seus lençóis.

Mas a cena que me ficou foi a dos três de joelhos a tentar adormecer a bebé a meio da noite, cantando amorosamente a música "Goodnight Sweetheart Goodnight". Resolvi aproveitar a dica e ultimamente tenho-a cantarolado à Rita. Infelizmente, acho que deve funcionar melhor com a voz do pai. Vai ser giro cantá-la com o João uma noite destas, durante uma das birras da Rita.


Difícil, claro, vai ser conseguir acordá-lo.

Grande mesa

É uma pena a mesa ser tão feiinha, porque este mecanismo sci-fi daria taaaanto jeito na sala da minha casa:


Claro que é coisa super-barata. A marca - DB Fletcher Designs - é inglesa e uma mesinha destas não costuma ultrapassar os... 50 mil euros.

Parabéns, pá!

Primeiro, o papa abdicou. Depois, caiu um meteorito na Rússia. Agora, a Ana anunciou que vai ter um filho. O mundo está louco.

Se queres guarda-nocturno, paga

A minha filha mais velha anda a atravessar uma nova fase de terrores nocturnos, que combinada com a fase de terrores diurnos, nocturnos, saturnos, uranos e neptunos da Rita (desde que o nariz se lhe entupiu faz mais birras do que os maquinistas da CP fazem greves) produz ali uma rapsódia de solicitações domésticas infanto-juvenis de pôr a cabeça em água ao mais dedicado dos pais - quanto mais a mim.

Se com a Rita não há outro remédio senão aguentar e esperar que passe, a Carolina, pelo menos, já está aberta a ameaças e chantagens, actividades que alegremente pratico com fins educativos. Por isso, ao fim de uma semana a ter que me deitar ao seu lado, informei-a de que passava a cobrar cinco euros (o valor da sua semanada) por cada vez que tivesse de ficar com ela até adormecer. Ela bem argumentou que aquilo era uma chantagem inadmissível, que culpa tinha ela de ter medo, mas eu disse-lhe para se ir queixar à polícia. Cinco euros ou nada feito.

Na primeira noite ainda optou por pagar. Mas ontem o capitalismo já falou mais alto. "Cinco euros é muito dinheiro", disse-me ela. "Pois é", concordei eu. "Tu és mau." "Pois sou." "Mas tu tens quase nove anos", acrescentei. E em menos de dois minutos a Carolina estava a dormir.

sexta-feira, 15 de fevereiro de 2013

The Sleeping Dad

Sabem aqueles tipos que descobrem que estão a ficar velhos quando deixam de aguentar noitadas e começam a ter dificuldade em recuperar das ressacas? Eu sou um desses, mas com os filhos a fazerem a vez do vodka e do gin tónico. Graças a esta recta final do Inverno, tenho apanhado umas brutas pielas de crianças nas últimas noites e mal me mantenho em pé. E isto não era assim há quatro anos, quando o Gui tinha a idade da Rita. Estou a ficar velho, senhoras e senhores. Ainda não como carne humana, mas tirando isso pareço um zombie a arrastar-se pela casa muito devagarinho, com o cérebro a processar a 10% da sua capacidade - The Sleeping Dad, estão a ver?



quinta-feira, 14 de fevereiro de 2013

Monsters University

A única coisa que me mete mais medo do que uma sequela é uma prequela, sobretudo quando é no maravilhoso legado de Monstros & Companhia que se está a mexer. À medida que a Pixar (vénia, vénia) vai ficando com menos ideias e deixa de fazer obras-primas (Carros 2 e Brave são filmes giros, mas não mais do que isso), a solução mais à mão é ir buscar os velhos sucessos e espremer mais um bocadinho, a ver se ainda sai leite. Este é o próximos opus da companhia, e acaba de ser lançado o seu trailer mais longo até à data. Avaliem por vocês (eu e mais cinco pessoas cá em casa - sim, com sorte também incluo a Ritinha - vamos ver de certeza quando estrear em Junho):

Quiz doméstico

Esta fotografia é:

a) A calçada de Lisboa depois de uma trovoada.
b) A cozinha depois de ter rebentado um cano do lava-loiças.
c) A casa de banho depois de os meus três filhos terem pedido para tomar banho de imersão.


Vocês já sabem a resposta, não é?

As minhas noites andam bué fixes

Decoração de interiores patrocinada pela Associação Nacional das Farmácias.


quarta-feira, 13 de fevereiro de 2013

Então foi isto

A propósito deste post, um leitor perguntou simplesmente "então?". É uma boa pergunta. Então foi isto: uma birra de duas horas da Rita, a mãe a jantar fora de casa, a irmã mais velha cheia de medo de ficar sozinha no quarto, enfim, um serão extremamente agradável. As parvoeiras dos mais velhos eu consigo aturar com maior ou menor dificuldade. O meu problema é mesmo com a Rita. Um bebé a chorar mais de cinco minutos dá completamente cabo de mim. Não consigo explicar. É uma coisa física. Tenho de repetir dez vezes para mim próprio "odeio bebés, odeio bebés, odeio bebés", morder-me todo para não lhe enfiar um tabefe naquelas mini-bochechas, e imaginar que daqui a um ano já passou. Foi assim com todos eles. Até acho que estou mais calmo e contemplativo com a Rita, divertimo-nos muito quando ela está bem disposta, mas quando as birras começam eu compreendo perfeitamente a dificuldade que o Bruce Banner tem em controlar o Hulk. Também eu fico com um animal a querer sair de dentro de mim. Só me falta mesmo ficar verde e rebentar com o guarda-roupa.

Os exercícios matinais da Rita

Caros colegas bebés a caminho dos seis meses:

Qualquer um de nós que se queria manter saudável deve começar mais ou menos por esta altura a tentar virar-se na cama e abandonar aquela postura extremamente aborrecida que consiste em estar o tempo todo de papo para o ar, que nem um nababo. Todos nós já conhecemos de cor os tectos das nossas casas, não é verdade? Pois bem, para alguns bebés mais ociosos e pouco dados a exercício físico, deixo aqui uma série de movimentos que eu pratico todas as manhãs, que isto da banha e do colesterol é para ter cuidado desde pequenino.

Começamos por nos posicionar ao centro da cama, para evitar que a moleirinha se espete contra o soalho. Por esta altura a nossa tola ainda é bastante elástica, mas convém não abusar da sorte.


De seguida, levantamos as pernas como se fôssemos fazer uns fantásticos abdominais. A ideia é ganhar o necessário impulso para aquilo que se segue.


E o que se segue é isto: um rápido movimento de rotação do corpo para a esquerda que tem de ser feito com o máximo de convicção, ou de outra forma não conseguiremos sair do lugar.


Se o impulso for bem dado, rapidamente chegamos à nossa posição de destino, que nos permitirá apreciar as linhas elegantes do aparador do quarto dos nossos pais ou qualquer outra peça de mobiliário de vossa casa, em vez dos desinteressante e monótonos tectos, que costumam ser branco sobre branco, como o quadro do Malevich.


Os bebés mais afoitos podem tentar a rotação completa do corpo, mas antes dos seis meses eu não aconselho, porque é extremamente difícil retirar o braço esquerdo debaixo da nossa pança. Isso exigirá ainda muita dose de papa, que por enquanto ainda me falta no bucho e na musculatura. Portanto, o que há a fazer é insistir na posição.


Cá está. Insiste, insiste, insiste, insiste mais um pouco, para desta forma começarmos a despertar certos músculos do nosso corpo ainda com pouco uso. É esticar bem, é esticar bem, vamos lá a isso.


E ao fim de cerca de 30 segundo de exercício em posição lateral, podemos descansar, regressando à nossa posição inicial.


Para os mais corajosos, depois de um breve descanso, é voltar a tentar, agora para o outro lado.


E pronto, é isto, espero que tenham gostado. E para concluir deixo-vos com uma das máximas do meu papá João: um bebé saudável fica menos insuportável.