segunda-feira, 25 de março de 2013

A primeira audição


Eis o meu texto de ontem na revista do CM, sobre um tema de que já falei neste blogue: a primeira audição da Carolina:

Ergueu-se. Fez uma vénia ao público presente. Sentou-se ao piano muito direita. Tocou três pequenos temas sem se enganar. Levantou-se. Ouviu as palmas. E foi sentar-se, enquanto sorria orgulhosa para os pais.

Num dos últimos sábados, a Carolina teve a sua primeira audição pública de piano. Ela entrou este ano para o Instituto Gregoriano, e é impressionante o que evoluiu em apenas seis meses. Nem eu nem a Teresa sonhamos com uma filha pianista profissional, até porque o piano exige um nível de dedicação obsessiva que não bate de todo com o perfil da Carolina, mas queremos muito que ela tenha uma formação musical sólida. Para além da maravilha que é alguém conseguir sentar-se a um piano e tocar, por puro deleite estético, a música dá disciplina mental, estabelece regras, impõe rotinas e fortalece a personalidade, tudo capacidades fundamentais que nos ajudam pela vida fora.

A Teresa tem quatro irmãs e um irmão, e todos eles frequentaram o Conservatório e aprenderam um instrumento. Eu, pelo contrário, fugia da música a sete pés quando era criança e nada me atemorizava mais do que um ditado melódico nas aulas de Educação Musical. Eu era aquele aluno clássico que tinha boas notas a tudo excepto a Música e a Educação Física, e a quem depois os respectivos professores caridosamente inflacionavam as notas finais, para não estragar a média. No fim do terceiro período, lá tinha uns 4 roubadíssimos, embora merecesse um 3, quando não um 2.

No sétimo ano, quando a Educação Musical saiu finalmente do meu currículo escolar, teria aberto uma garrafa de champanhe se a tivesse à mão. Só mais tarde, quando comecei a frequentar grupos de Igreja e a aprender a tocar guitarra, já com os meus 15 ou 16 anos, é que comecei a lamentar tudo aquilo que não aprendi. E ainda hoje continuo a lamentá-lo.

À medida que a família cresce, vou, portanto, acumulando invejas: há mais de 20 anos que invejo o ouvido da Teresa e o enorme talento que ela tem para cantar e para tocar flauta transversal; há seis meses que invejo a Carolina por tocar piano; e com sorte irei invejar também o Tomás, o Gui e a Rita, que estão condenados a aprender música, mesmo que não lhes apeteça. Cá em casa o dó-ré-mi é tão importante quanto o á-bê-cê – é preciso aprender a ler, a escrever e a tocar. Como é típico dos analfabetos (sonoro, neste caso), eu dou bastante valor àquilo que me falta.


A ilustração é do José Carlos Fernandes.

2 comentários:

  1. Olá, bom dia,

    Gostava de saber porque escolheu o Instituto Gregoriano, e porque não o Conservatório Nacional ou a Metropolitana? Neste momento estou a ponderar a oferta disponivel em termos de educação musical para o meu filho e estou um pouco perdida... Obrigada

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  2. Parabéns! Aprender música e um instrumento é de facto maravilhoso. Penso que todos os meninos deviam poder aprender, e devia haver em todas as escolas. Quando a minha filha começou, a prof. disse algo que nunca esqueci, que a aprendizagem de um instrumento vai muito para além da aprendizagem do próprio instrumento, e é tão verdade! Desejo-vos anos de gozo com a partilha da música!

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