segunda-feira, 6 de maio de 2013

Põe-te a andar

Ilustração de José Carlos Fernandes

Eis o meu texto de ontem na revista do CM. Dedicado ao John Wayne e à excelentíssima esposa. Que saudades eu tinha de me vestir de cowboy.

Sempre me interessou a forma como as pessoas se movem ao andar. Nada a ver com desfiles de top models nas passarelas; tudo a ver com os tempos em que via filmes de cowboys em catadupa e ficava fascinado com a pinta gingona de John Wayne. Dean Martin – galã, actor, cantor e sedutor encartado – disse um dia que “ninguém anda como John Wayne”, e o que ele queria dizer é que estávamos diante do cúmulo da elegância do andar masculino. E, de facto, basta ver os filmes: mesmo que alguns o considerem efeminado o que outros digam que é o andar de alguém que precisa urgentemente de mudar as fraldas, Wayne não se parece com nenhum outro.

Quando caminhava, todo o seu corpo entrava em movimento, dos calcanhares até aos ombros, e havia nele um swing único: mesmo ao estugar o passo parecia deslocar-se em câmara lenta. Wayne era um gigante – tinha mais de um metro e noventa –, mas os seus pés eram pequenos, e talvez fosse esse desequilíbrio (mais tarde agravado pelo aumento do perímetro abdominal) que conferiu aquela identidade tão marcante ao seu andar, ao ponto do “John Wayne walk” fazer hoje parte do património do cinema.

Mas não precisamos de usar esporas nem calças apertadas para cada um de nós ter o seu próprio estilo – é algo que nos acompanha desde a mais tenra idade. Estima-se que uma pessoa ande, em média, mais de 100 mil quilómetros ao longo da vida, o suficiente para dar três voltas ao planeta Terra, mas apesar de ser uma das actividades mais regulares e estruturantes da nossa existência, temo bem que ainda falte estudar a fantástica multiplicidade de andares e aquilo que cada um deles diz sobre a identidade do seu portador.


E tudo isto vem a propósito do quê? Vem a propósito da minha esposa e da minha filha Carolina. Eu sempre achei imensa graça à forma como a Teresa anda, porque é bastante original e lhe dá um ar alegre e teenager, mesmo aos 38 anos. Aquilo que é impressionante – e mostra a força da transmissão genética – é isto: agora que a Carolina está a começar a ser gente e a aproximar-se da adolescência, a forma do seu andar está a replicar na perfeição a forma da mãe. Isso tem a ver com a constituição do seu corpo, com certeza, mas eu divirto-me imenso a vê-las andar à minha frente, o original M e a cópia XS, matutando sobre o quanto da personalidade ambas está escondido naquele andar. E o tanto que ele diz sobre cada um de nós.

Já agora, para os interessados que não se recordam dos filmes de cowboys da sua juventude, eis o "John Wayne walk", acrescido da respectiva paródia nas versões francesa e americana de A Gaiola das Loucas:


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